É novamente tempo de eleições! Queremos votar bem. Desejamos
que o bem comum seja o grande critério de quem se candidata e de quem vota. No
entanto, deparamo-nos com uma verdadeira caça ao voto. São promessas, acusações
mútuas, alianças entre pessoas que, antes, eram opositoras politicamente.
Muitos candidatos se apresentam como se fossem salvadores da pátria. Alguns
trazem projetos para quando assumirem o mandato. Outros simplesmente tentam
conseguir a simpatia da população, oferecendo benefícios imediatos, que até
podem ser necessários, diante da carência em que se encontra nosso povo. Tudo
isso deixa o eleitor bastante confuso.
Consciente da responsabilidade de todos os cristãos no
sentido de dar ao desafio eleitoral uma resposta à luz da fé, a Arquidiocese do
Rio de Janeiro propõe os seguintes itens para a reflexão que antecede o voto
consciente.
O EMPENHO PELA PAZ
A paz é um grande clamor e uma reivindicação de todos. Não
podemos, porém, imaginar que paz seja apenas ausência de guerra ou de
violência. No atual momento da história da humanidade, diante da crescente onda
de violência e exclusão social, a proposta de uma cultura da paz tem adquirido
grande importância. A paz é também presença de justiça, solidariedade,
partilha, desenvolvimento e progresso dos povos.
Ao escolher os candidatos, é preciso saber o que eles pensam
sobre cada uma destas condições para a existência de uma verdadeira cultura da
paz. É preciso saber como eles realmente têm se portado na vida pública e na
comunidade onde vivem. É preciso saber se o discurso sobre a paz não é apenas
um conjunto de palavras usadas apenas para atrair o eleitor.
RESPEITO À VIDA E À DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA
O primeiro passo para a construção da paz é a defesa da
vida e da dignidade da pessoa humana em todas as suas manifestações, desde a
concepção até o fim natural, com a morte. Isto somente é possível pela rejeição
de tudo que fere a vida, com atenção especial para o aborto e a eutanásia , a
exploração dos menores, o abuso de idosos e deficientes e o insuficiente
serviço de saúde para os mais necessitados. Isto somente é possível também pela
defesa da infância e da adolescência, do combate ao uso de drogas, à
prostituição, à pornografia e à exploração do trabalho infantil.
Pensar na vida e na dignidade humana é, também, pensar em
quem respeita o equilíbrio da natureza: florestas, rios; promove o saneamento
básico e a construção de moradia em lugares sem risco.
E ainda em quem se preocupa com o transporte público, digno
e de qualidade para a população. Em quem se compromete com uma organização
eficaz para a segurança da sociedade.
DEFESA DA FAMÍLIA
Para um candidato efetivamente se preocupar com a vida e a
pessoa humana, ele deve ter a defesa da família como uma de suas principais
metas. Infelizmente, em nossos dias, muitos costumam dizer que a defesa da
família é uma atitude conservadora e ultrapassada. Outros candidatos, sabendo
que a Igreja defende e promove a família, até incorporam este tema em seus
discursos. Na hora, porém, de efetivamente sair em prol da família, pouco ou
nada fazem. O Evangelho, porém, nos ensina que deixar de defender a família é
não se comprometer com a vida e a paz.
Defende a família quem se esforça pela geração de emprego e
renda dignos para os pais e mães, escola para as crianças e assistência médica
para todas as idades. Defende a família, quem se empenha pelos direitos
individuais, pela família baseada no casamento entre um homem e uma mulher,
pelo direito dos pais de escolherem a educação de seus filhos.
Mas, é preciso tomar muito cuidado para não confundir a
defesa da família com projetos em favor das uniões estáveis, do casamento entre
pessoas do mesmo sexo ou a legalização do aborto.
Por isso, diante dos candidatos, não indague apenas se ele
defende a família. Levante algumas questões bem concretas, baseadas no que a
Igreja indica como defesa autêntica da família. Faça, então, o discernimento a
partir das respostas teóricas e práticas que a vida do candidato apresentar.
DIREITO À EDUCAÇÃO INTEGRAL
Na defesa da família, não se pode deixar de lado o direito
de todos à educação. À luz da fé, a educação é um direito de toda pessoa,
cabendo à família e não ao Estado a direção do processo educacional. A
verdadeira educação é aquela que respeita as opções da família, sem impor
ideologias do Estado ou de uma parcela da sociedade.
O que seu candidato tem de fato realizado em favor da
educação? O que ele diz quando mostramos a ausência de escolas, especialmente
para os mais pobres? Como ele age diante da uma realidade que transformou a
educação em fonte de lucro, deixando em segundo plano a formação integral das
pessoas?
ENSINO RELIGIOSO CONFESSIONAL E PLURAL
A educação integral respeita as convicções das pessoas e a
orientação religiosa das famílias. Uma grande conquista foi a aprovação, no
Estado do Rio de Janeiro, do Ensino Religioso Confessional e Plural.
Infelizmente, já há muita gente querendo bloquear este avanço, seja procurando
a revogação da lei, seja impedindo sua implantação.
Você conhece esta proposta de ensino religioso confessional
e plural? Que passos você tem dado para conhecer bem esta proposta? E o seu
candidato? O que ele pensa sobre este assunto? Como ele tem se posicionado? Ele
está entre os que têm tentado revogar a lei? Está entre os que estão impedindo
sua implantação?
EFETIVA SENSIBILIDADE PELOS POBRES
Não há verdadeira defesa da vida nem da pessoa humana, enquanto
não se tomarem medidas concretas em relação à miséria em que vive boa parte da
nossa gente. Também neste ponto é preciso ter muita atenção, pois todos os
candidatos dizem estar ao lado dos pobres. É lamentável ver candidato que se
aproveita do sofrimento e da fragilidade dos pobres para ser eleito. São
promessas enganosas e ajudas que não chegam ou, quando chegam, nada fazem para
superar a pobreza. Certas atitudes são, na verdade, instrumentalização dos
pobres.
O que o seu candidato tem feito em favor dos pobres? Ele é
daqueles que, por exemplo, abrem um local de atendimento médico, emprestam
ambulância, mas não se preocupam com um sistema de saúde público acessível a
todos? O que o seu candidato tem feito em favor de habitação, saúde, emprego e
educação para os mais pobres? As atividades de seu candidato em favor dos
pobres vão realmente vencer a pobreza ou servem apenas como propaganda para
ganhar voto?
USO DE VERBAS PÚBLICAS
A superação da pobreza passa também pelo modo como se
administram as verbas públicas. Infelizmente, os noticiários têm mostrado
vergonhosos abusos no trato da coisa pública. A corrupção tem sido o prato do
dia. Em boa parte, os orçamentos são apenas instrumentos de barganha política.
Vemos constantemente quantias fabulosas de dinheiro público serem usadas pela
máquina administrativa em gigantescas campanhas de divulgação de feitos dos
governos em seus vários níveis, enquanto a saúde, a educação, a habitação e a
geração de emprego são deixadas em segundo plano ou mesmo esquecidas. É
preciso que a sociedade, por meio dos organismos de participação política,
atue vivamente na indicação do que, de fato, é necessário para a melhoria nas
condições de vida da população.
RESPEITO À RELIGIÃO
O desrespeito que acontece em relação à vida, às pessoas, ao
bem comum e às coisas públicas também ocorre em relação à religião. Ora, quem
não respeita a religião das pessoas está indicando que não respeita nada mais.
E muitos são os modos de se desrespeitar a religião.
Alguns usam a religião para enriquecer, explorando a boa fé
do povo. Outros usam a religião para garantir que são os candidatos de Deus.
Mesmo em nossos dias, marcados pelo diálogo e pelo ecumenismo, existem alguns grupos
religiosos que se preocupam mais em dividir do que unir e dialogar. Alguns se
dizem religiosos, se dizem católicos praticantes, mas só os vemos no período
eleitoral.
De que maneira seu candidato se posiciona nas questões
religiosas? Respeita? Tenta tirar proveito para ganhar a eleição? Despreza,
critica ou mesmo agride a Igreja Católica?
A HISTÓRIA PESSOAL DO CANDIDATO
A eleição para um cargo político não transforma pessoas. Se,
um político se revela diferente do que conhecíamos antes da eleição, é porque,
na verdade, está desempenhando um papel para convencer os eleitores. Portanto,
precisamos conhecer bem a vida dos candidatos.
Se for alguém com carreira política, é importante olhar o
que já fez nos mandatos anteriores, descobrir as causas que abraçou, se esteve
ou não envolvido em falcatruas, se, com facilidade, mantém contato com seus
eleitores ou se deles se afasta depois de eleito.
Se for alguém que esteja iniciando a carreira política, é
importante olhar sua vida profissional, nela buscando honestidade,
transparência, respeito às pessoas e ao bem comum. É preciso verificar se é
uma pessoa que se aproveita das outras, se o estilo de vida corresponde ao que
faz.
Por isso, será preciso entrar em contato mais intenso com os
candidatos, conversando com eles e com quem os conhece, tomando informações,
assistindo a entrevistas nos diversos meios de comunicação (não apenas um!).
Um bom caminho é sempre perceber quem está apoiando o
candidato ou candidata. A partir de quem o apóia, também podemos ter uma boa compreensão
de quem é o candidato. Neste sentido, é muito importante saber de onde estão
realmente vindo os recursos financeiros para a campanha. Quem está financiando
o candidato?
A VERDADEIRA CONTRIBUIÇÃO DO CANDIDATO
Há muitos cristãos dedicados, que desejam viver a santidade.
Têm amor a Deus e ao próximo. Amam tanto a Deus que desejam mudar a sociedade.
Estes cristãos se candidatam a cargos eleitorais com as melhores das
intenções. Em geral, se filiam a partidos pequenos, que fazem coligações com
outros maiores.
O problema é que, de acordo com o sistema eleitoral
brasileiro, o voto dado a um destes candidatos pode, por mais estranho que
pareça, eleger outra pessoa com propostas que não vão ajudar o povo. Isto
acontece porque a legislação brasileira segue o sistema de voto proporcional,
isto é, se uma pessoa não for eleita, o total de seus votos vai para o partido
ou para a coligação, somando-se ao número de votos do candidato mais bem
colocado.
Cuidado com candidatos que desejam dar um pulo muito grande,
queimando etapas! O cristão que deseja se engajar na política deve conhecer a
doutrina social da Igreja, participar das pastorais sociais, filiar-se à
associação de moradores de seu bairro, participar do sindicato de sua classe
trabalhista, ser filiado a um partido e, depois, quem sabe, se candidatar.
O PARTIDO A QUE O CANDIDATO ESTÁ FILIADO
Embora, no atual quadro político brasileiro, não se dê muito
valor aos partidos políticos, é indispensável identificar o partido ao qual o
candidato está filiado. Isto acontece porque não existe candidato isolado do
partido. Mesmo que, a toda hora, tenhamos notícias de políticos mudando de
partido, como se o partido não valesse muito, a verdade é bem outra.
O partido político também pesa na hora em que o candidato se
posiciona diante das questões que lhe são apresentadas. Um político pode até
não votar com o partido em questões de menor importância, mas, naquelas que
realmente atingem a vida do povo, é ali que partido e candidato se revelam.
Estas questões dizem respeito, por exemplo, ao destino das verbas públicas, à
ausência de manobras escusas para garantir benefícios, firmeza diante da
corrupção e à defesa da vida dos pobres.
Por isso, na hora do voto, não podemos separar demais o
candidato do partido. Devemos identificar qual é o partido e o que este
partido tem feito em benefício do povo. Precisamos saber no que o partido está
envolvido. Desconfie bastante de candidato que diz aos eleitores para não se
preocuparem muito com o partido.
VOTO NÃO TEM PREÇO. TEM CONSEQUÊNCIAS.
Vários são os exemplos de políticos que agem comprando
votos. Eles fazem isso, por exemplo, com obras realizadas no final dos mandatos.
Outros prometem empregos, garantem cargos. Estes e muitos outros exemplos são,
na verdade, compra de voto, troca de favores. Escolha candidatos que não trocam
seu voto por tijolos, bolsas de alimentos, remédio, promessas ilusórias para
melhorar seu bairro.
Foi por isso que o povo brasileiro, em um dos grandes
momentos da sua história cívica e política, propôs e conseguiu a aprovação da Lei
Contra a Corrupção Eleitoral, Lei nº 9840, de 28 de setembro de 1999. Ela se
destina a coibir o crime da compra de votos e o uso da máquina administrativa.
A pena é a cassação do registro do candidato, aplicada antes da eleição ou da
diplomação do infrator. E, mais recentemente, a chamada Lei da Ficha Limpa que
nos dá a possibilidade de olhar para a vida e o passado do candidato. Pois não
queremos pessoas que pela corrupção, ou qualquer outro meio ilícito, aumentam
seus bens.
Pelo Brasil afora, existem comitês de fiscalização. Toda
comunidade e todo eleitor devem saber onde fica o comitê local e dele
participar ativamente.
COMO AGIR NA COMUNIDADE?
A Igreja, como instituição pública, não pode fazer propaganda
eleitoral. Ela pode apontar critérios para que os eleitores possam decidir
conforme sua consciência.
Estes critérios servirão muito pouco se nossas comunidades
não estiverem atentas a alguns perigos.
O primeiro perigo é o de não se comprometer com o momento
eleitoral, achando que este é um assunto do mundo, sem ligação com a vida na
fé. O melhor caminho para evitar este perigo é sempre lembrar que por omissão
também se peca.
Podemos criar momentos de debates com vários candidatos, de
vários partidos para que definam suas propostas e respondam às questões de
nosso interesse para que tenhamos mais facilidade para usar nosso direito de
escolha. Por isso, é preciso estimular reuniões, debates com candidatos e
outros momentos para a tomada de consciência a respeito do voto responsável.
Estes debates podem ser promovidos pela igreja e, até mesmo, realizados nos
salões paroquiais, mas precisam respeitar a lei que orienta que o debate deve
ser sempre com candidatos de vários partidos. Ao mesmo tempo ou promovidos em
vários dias de debates em que os todos os partidos tenham sido instados a
enviar seus representantes.
O segundo perigo é amarrar a vida da comunidade a um candidato.
Às vezes, fazemos isto até sem perceber. Assim acontece quando o candidato
promete algum tipo de ajuda de que a comunidade tanto precisa. O melhor caminho
para evitar este segundo perigo é lembrar que os discípulos de Jesus não se
devem deixar usar por quem quer que seja, mesmo que sob o pretexto de ajuda. Se
um candidato quiser se aproveitar da comunidade, o que não fará quando, pelo
voto, lhe dermos o cargo?
Portanto, não podem ser colocados nas igrejas, salões e
demais espaços da comunidade, cartazes, faixas, adesivos ou qualquer outra
forma que vincule a comunidade a algum candidato, mesmo que originário da
própria comunidade.
Também não se pode abrir espaço nas atividades religiosas
(celebrações, encontros etc.) que beneficiem um único candidato ou que se
caracterize como propaganda eleitoral direta ou indireta. O espaço especificamente
religioso, principalmente a Celebração Eucarística, não deve ser
instrumentalizado para a apresentação direta ou indireta de algum candidato,
mesmo que este seja originário da comunidade. Se a comunidade deseja ouvir
algum candidato ou um conjunto de candidatos, poderá fazê-lo em encontro
especial, claramente identificado como sendo para esta finalidade. Nunca,
portanto, nem na Celebração Eucarística nem em encontros de oração ou
evangelização.
Clérigos e religiosos não podem permitir que sua imagem seja
associada a um ou outro candidato, mesmo que a ele ou a ela vá receber seu
voto. Consequentemente, não se deixarão fotografar ao lado de candidato algum,
bem como prontamente solicitarão aos candidatos que retirem de sua propaganda
impressa ou virtual imagens que, direta ou indiretamente, venham a dar a
impressão de indicação de voto.
Uma terceira atitude que precisamos evitar é a de se
fazerem listas indicando ou vetando candidatos. O voto é um ato da
consciência, exercido na liberdade e na responsabilidade. Como vamos querer um
país livre se, já na hora da eleição, desrespeitamos a consciência das pessoas?
Por isso, não serão, em hipótese alguma, elaboradas listas indicando em que
candidatos as pessoas devem ou não devem votar.
Se alguém pedir à comunidade uma ajuda para discernir o
voto, a única resposta é: “Venha! Participe conosco das reuniões e dos debates
e decida de acordo com a sua consciência!”
Um excelente local para que os católicos possam se reunir e
bem discernir em quem votar é a própria residência. Por que não convidar os
parentes, amigos e conhecidos, abrir a residência e convidar o candidato ou
candidata que você gostaria de ouvir e interpelar? Por que esperar que a comunidade
faça uma reunião?
ARQUIDIOCESE DO RIO DE JANEIRO
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