Os alunos do ensino fundamental, de turno integral, das escolas municipais do Rio de Janeiro vão contar com um reforço educacional, a partir do 2º semestre de 2012 – o Ensino Religioso (ER). Esse complemento, oferecido de forma opcional, pretende preencher uma lacuna essencial, presente no ser humano: a dimensão espiritual, que não estava sendo contemplada com o investimento apenas na parte intelectual e física do estudante.
Por meio da Lei 5.303/2011, sancionada pelo prefeito Eduardo
Paes, que instituiu o ensino religioso na Rede Municipal de Ensino, as escolas
de turno integral vão oferecer a disciplina, de forma opcional, plural e
confessional, para os alunos do ensino fundamental. As religiões contempladas,
depois de uma pesquisa nas escolas, foram: católica, evangélica, espírita e
afro-descendentes. A legislação permitirá, por exemplo, aos pais católicos,
que não tiverem condição de colocar seus filhos em um colégio particular
católico, a oportunidade de oferecer esse conhecimento específico para eles.
“O ensino religioso não é um corpo fora do projeto pedagógico
de uma escola. A educação tem que propiciar e integrar a dimensão material e
espiritual do ser humano, contemplando o seu valor absoluto e infinito, a
sua sacralidade e indivisibilidade”, afirmou o ex-deputado Carlos Dias, autor
da Lei 3.459/2000 que instituiu o ensino religioso confessional nas escolas
públicas do Estado do Rio de Janeiro.
O coordenador do Ensino Religioso na Arquidiocese do Rio,
professor Raimundo Nonato, ressaltou que o ER está dentro de uma concepção
pedagógica e trabalha a identidade religiosa do aluno, o sentido de sua existência,
buscando acompanhar a visão de mundo que esse aluno tem, a partir de sua
experiência com o transcendente, e as atitudes que precisa ter para viver de
forma coerente com o seu credo.
“Ensino religioso não é catequese, é o aprofundamento da
identidade religiosa do aluno. Esse respeito por si mesmo e pelo outro é um
valor importantíssimo e vai repercutir numa convivência mais fraterna e
solidária das pessoas no ambiente educacional. Eu vejo o ensino religioso como
um grande passo para que a sociedade viva a solidariedade, o respeito ao outro,
a justiça e a cidadania”, afirmou o professor.
Ele afirmou que, durante os 23 anos de vivência do ensino
religioso na rede estadual, não observou qualquer conflito religioso entre os
alunos.
“Na montagem de tarefas em conjunto, trabalhando a interdisciplinaridade,
em projetos onde uníamos a religião à arte e às questões sociais, sempre houve
boa convivência e respeito mútuo entre alunos e professores de religiões
diversas. Quem diz que pode haver conflito entre as religiões nas escolas é
porque nunca vivenciou a questão, e quer ‘tirar a fé do coração de nossos jovens’,
como já disse o Papa Bento XVI”, afirmou.
Para o professor, alguns credos não foram incluídos, porque
essas religiões e manifestações religiosas não se apresentaram e deixaram
seus lugares em branco.
Além disso, na pesquisa de campo feita com os alunos,
algumas religiões minoritárias não foram citadas por eles e, por isso, não
puderam ser incluídas. “O ensino religioso foi aberto para todos, mas alguns
não querem essa disciplina nas escolas”, informou Nonato.
CRESCIMENTO TOTAL
Segundo especialistas, o ensino religioso precisa ser oferecido
de forma confessional, ou seja, cada turma com professores e alunos do mesmo
credo, porque a abordagem superficial de várias religiões pode acabar sendo
tendenciosa. Mesmo sem perceber, de forma subjetiva, o professor pode
transmitir a fé em uma religião específica e até mesmo a ausência de fé, o que
poderá influenciar o aluno a seguir em uma direção contrária à deseja
da pelos seus pais e responsáveis.
A professora Ediléia da Silva Santos, membro do conselho
fiscal da Associação de Professores de Ensino Religioso Católico, que já foi
coordenadora da Educação Religiosa no Estado do Rio de Janeiro, essa
disciplina promove a convivência fraterna e respeitosa entre alunos de diferentes
religiões.
“Cada professor vai trabalhar com a especificidade do seu
próprio credo. Em breve, veremos a maravilha que será o ensino religioso nas
escolas, porque uma criança não precisa somente de geografia, matemática e
história, para crescer como pessoa humana”, reforçou Ediléia.
A CONSTITUCIONALIDADE DA LEI
Segundo Ediléia, o ensino religioso está assegurado pela
Constituição Federal, no artigo 210, parágrafo 1º; na Constituição Estadual,
no artigo 310, e pela Lei de Diretrizes e Bases. “É importante também
ressaltar a Resolução nº 2, de 1998, da Câmara de Educação Básica do Conselho
Nacional de Educação, que instituiu as diretrizes curriculares nacionais para
o ensino fundamental, onde a educação religiosa foi citada como uma das áreas
que deveriam ser priorizadas em toda escola, de 1º e 2º grau. Existe o
entendimento de que o ER não é uma informação sobre religião, mas formação religiosa
para o aprendizado do aluno”, disse a professora.
Carlos Dias também destacou que o ER está de acordo com a
Constituição Brasileira. “Existe também um acordo assinado entre a Santa Sé e
o Estado Brasileiro que fala objetivamente do ensino religioso confessional e
plural. Esse tratado internacional tem força de lei e peso constitucional na
jurisdição brasileira. Pelo fato de ser confessional, o ER permite que cada
credo tenha a sua expressão autêntica”, disse.
EDUCAÇÃO PARA A PAZ
Carlos Dias ressaltou que o ER agrega um valor fundamental,
porque constrói a pessoa, ajudando na maneira como ela vai se posicionar,
diante da realidade vivenciada, e capacitando-a para maior reflexão sobre as
atitudes de paz e justiça que devem ser tomadas. Ele acredita que o
investimento na disciplina do ER gera uma educação para a paz dentro das
escolas, porque recupera o ambiente educacional.
“Observamos a presença de drogas nas escolas, gravidez na
adolescência, violência contra alunos e professores. Em muitos locais, é o
aluno quem dita as regras da sala de aula, e não o professor. Além disso os
níveis de repetência e evasão escolar estão altíssimos. O ER tem um sentido
de reintegração. A religião dá à pessoa senso crítico apurado para fazer
escolhas”, disse.
Ele acredita que alguns não conseguem ver o valor do ensino
religioso, por causa de um preconceito contra as religiões, e que um estado
laico, mas não ateu e de maioria cristã, deve respeitar a autonomia e a
essência religiosa de todas as pessoas. “O ER é um auxílio fundamental para
que as crianças tenham um futuro melhor”, incentivou.
CLÁUDIA BRITO
FOTO: GUSTAVO DE OLIVEIRA