sexta-feira, 28 de junho de 2013

Voz das ruas

A voz das ruas ainda se faz ouvir. Há de ser sentida por algum tempo. Agora, passada a perplexi­dade inicial, tendo as avaliações de especialistas, abre-se o exercício de buscar respostas e de procurar soluções práticas para o clamor dos protestos. É o papel dos go­vernantes. A eles cabe tratar as reivindicações: ouvi-las, discerni­-las, viabilizá-las.
Embora apartidário, o movi­mento ao nomear os problemas responsabilizou o poder dos go­vernantes. Distribuem-se agora na pauta das decisões as prioridades de interesse da população. Quem poderia prever tal exercício do poder, a partir do clamor advindo das ruas? Brado por melhorias vitais, por mudanças de rumo, por correção da fraudulência e da corrupção, a favor da saúde e da educação e da mobilidade, sobre­tudo, o combate à PEC 37.
Os protestos foram ato po­lítico, no sentido nobre de in­teresse pelo bem de todos. Portanto, com dimensão ética e moral. A insatisfação fora le­gitimada pela verdade dos fatos apontados. Expressara a vonta­de do bem e do justo: “a vida boa com e para os outros nas insti­tuições justas” (Paul Ricoeur). Ao contrário dos baderneiros e saqueadores, que só visaram ao saque e à depredação. Contra esses o protesto ecoou seu brado de rejeição: não são dos nossos.
Os jovens atraíram os adul­tos, pais e mães, e por estes, até as crianças. Coloriram-se de branco da paz contra baderneiros, vân­dalos e saqueadores. Revestiram­-se de brasilidade no verde e no amarelo da bandeira e no canto do Hino Nacional. Estamparam as raízes da nacionalidade pelos símbolos da pátria. Uma jovem confessou em público a surpresa consigo mesma: “não sabia que era tão patriota”. Não o ufanis­mo dos poetas românticos e dos sambas de exaltação de outrora, mas o patriotismo em favor dos que não têm acesso à saúde, à educação, ao transporte público de qualidade. Quem carece do afeto da “pátria gentil” na priori­dade destes serviços essenciais.
A pauta formulada pelas ruas, em faixas e cartazes, está pontuan­do a discussão governamental em ordem às decisões. Ou não será? Se não for, perderemos uma oportu­nidade histórica sem precedentes, pois as circunstâncias que fazem os acontecimentos não se repetirão, embora possam ser semelhantes. A história não retornará, nem as pessoas e nem os governantes, e os jovens de hoje, insatisfeitos, mas otimistas, logo envelhecerão. Poderão desencantar a seguir.
As críticas expressaram não só a insatisfação ou o descrédi­to com a política atual, mas o grave problema da legitimação partidária. O sistema político­-partidário é pouco represen­tativo. Talvez por isso, a cada eleição cresce o voto nulo. Não votam porque não se veem legiti­mamente representados. Cresce igualmente o voto irresponsável dos iludidos pelas promessas eleitoreiras. Daí, os jovens gri­tarem aspectos indicadores da necessidade da reforma política.
O jovem, mesmo insatisfeito, tornou-se, por instantes, ator político ou social interessado. Ele protestou. Exerceu a cidadania. Disse ao Brasil que ele quer e o que não quer. Acreditou na me­lhoria possível da pátria. Encheu as ruas de esperança. Não temeu revelar seus sonhos. Estimulou a nação a lhe dar crédito. Ousou e foi capaz de pretender.
DOM EDSON DE CASTRO HOMEM